quarta-feira, janeiro 31, 2007

A falta insustentável.


Se for assim,
Já se tentou de tudo.
E nada resta.
A não ser o vazio.
O grande vazio dentro de cada um de nós.
O grande vazio que não nos deixa dormir a noite.
O grande vazio que nos chama de dia, em meio à multidão.
O vazio que mata, que cala, que geme.
O vazio que existe no som dos passos de uma pessoa especial.
Uma pessoa que sempre vai, e mesmo que seja redundante dizer isso...
Uma pessoa que nunca fica.
Que marca sua ausência,
Com esse grande vazio que há dentro de cada um de nós.
O vazio que no começo alivia, que quase rima,
Que combina com a dor...
Um vazio que se torna um buraco,
que transforma em angústia a falta insustentável.
Um vazio que é quase um retrato.
De tudo que não deveria ser, e é.

sexta-feira, janeiro 19, 2007

Considerações sobre a felicidade.

Pensando sobre o poema do Enzensberger, me perguntei sobre o momento da felicidade. Sim, é verdade. A maioria das pessoas não consegue falar sobre ela ou compreender sua existência até que esta passe ou que se perca. Aí as pessoas realmente a valorizam. Talvez seja porque quando se está feliz de fato não se pense em coisas como felicidade ou qualquer outro assunto que mereça maiores divagações. Ou talvez seja porque as pessoas realmente confundem felicidade com êxtase, e este realmente passa rápido demais para dar tempo de ao menos se dar conta dele. Eu particularmente sempre gostei de pensar que sei que sou feliz. Em vários períodos da minha vida tiro um pequeno momento para olhar todo o cenário de fora de mim mesma, considerar toda a situação e pensar: isso é felicidade! Quantas vezes já não estive numa praia, na companhia de um ou dois amigos, achei o lugar o mais bonito do mundo, a noite a mais perfeita e a companhia inigualável? Aprecio a sensação de estar dando o valor certo às coisas, de ter consciência da dimensão de cada momento e cada pessoa. Adoro olhar para os mesmos olhos azuis e saber que estar ao seu lado é felicidade, e que poucos olhos me entendem tanto assim. Adoro simplesmente sentir isso, ainda que não diga nada. Guardo dentro de mim, como fotografias bem nítidas, vários momentos que simbolizam essa felicidade. E somente espero que essas fotografias nunca fiquem velhas demais. Claro que aí surge outro problema. O de se ligar demais ao presente e as pessoas, dar valor demais e depois sofrer com eventuais perdas ou com a passagem do tempo. Mas prossigo pensando que é melhor padecer por sentir demais, que amargurar por sentir de menos.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Por que os poetas mentem?


PORQUE OS POETAS MENTEM:
MOTIVOS ADICIONAIS

Enzensberger, Hans M.

Porque o momento em que a palavra FELIZ é dita
nunca é o momento da felicidade.
Porque os lábios do sedento
não verbalizam sua sede.
Porque PROLETARIADO é uma palavra
que não passa pela boca do proletariado.
Porque a vítima do desespero
não tem vontade de dizer:"Estou desesperado".
Porque orgasmo e ORGASMO
estão a mundos de distância.
Porque o moribundo,em vez de anunciar"estou morrendo",
estertora apenas um gemido baixo
e, para nós, incompreensível.
Porque são os vivos
que enchem o ouvido dos mortos
com suas notícias atrozes.
Porque as palavras sempre chegam
tarde demais ou demasiado cedo.
Porque é um outro,sempre outro,quem fala
e porque aquele de quem se fala
silencia.