sábado, novembro 11, 2006

Dias chatos


Tenho vivido dias de tédio patético
De solidão patética
Dias de coisas totalmente insignificantes
De cores totalmente cinzas
Dias que passam e eu nem ao menos reparo
Dias que não viram fotografias bonitas
Ou lembranças divertidas em noites de bar
Dias que não deveriam existir
Mas que estão no centro da vida
São o miolo de tudo
O que liga uma fotografia a outra,
Uma historia engraçada a outra
Esse meio é feito desses dias
Dias incrivelmente sem graça
Onde tudo o que sinto é ausência
Ausência dos amigos
Dos sorrisos, dos abraços
Sinto falta dos telefonemas, cartas, recados
Das viagens, dos bares, do céu estrelado
Saudade das noites da Parnaioca,
Do gosto do mar salgado
Saudade de tudo que já foi bonito
E hoje está amarelado
Ah, que dias chatos!

quarta-feira, novembro 01, 2006

Os ombros suportam o mundo

Os Ombros Suportam o Mundo

Carlos Drummond de Andrade


Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.


Quem nunca se sentiu delicado a ponto de preferir não assistir ao espetáculo bárbaro ?
Quem não odeia a ordem de viver ?

Vida sem mistificação não é vida!
Ah, Drummond, Drummond...